quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Gamboa IVb

Volto a este simpático imóvel, originalmente de apenas um pavimento, que já havia publicado aqui no blog em uma postagem anterior, apenas com imagens do Google Street View, que não revelava muita coisa sobre os azulejos.



Infelizmente esta casa já perdeu (ou nunca teve, o que é pouco provável) o medalhão com a data de sua construção, que normalmente vemos no topo, ao centro, logo abaixo do beiral do telhado, em casas desta época. Ela já passou por alguma restauração, quando foram usados azulejos de reposição (canto inferior direito e lateral direita) tecnicamente inferiores aos azulejos originais.

Percebam que ela também já recebeu um "puxadinho", ganhando mais um piso acima do original, onde até usaram azulejos, mas de uma padronagem mais recente, e não muito compatível com os demais.

Detalhe dos azulejos usados na área principal da fachada.


Este azulejo já foi visto por aqui, logo no início do blog, numa postagem sobre uma casa (vejam neste link). Entretanto, há uma variação da forma como as pétalas das flores em azul foram preenchidas em um e no outro caso. Mais à frente teremos algum subsídio para pensar a variação.


Na foto abaixo podemos ver um detalhe comparativo dos azulejos originais (em cima) e os usados como reposição (embaixo). Fica bem claro como os azulejos de reposição são tecnicamente inferiores aos originais.



Nas fotos acima e abaixo vemos juntos todos os quatro azulejos usados no imóvel (bem como um "invasor", à esquerda, no alto da foto abaixo).


Veja abaixo um detalhe dos azulejos usados no friso superior.


Os azulejos acima eram um mistério até ontem, quando recebi de Peter Sprangers, do Historische Kring Tolsteeg-Hoograven, Utrecht, uma série de pranchas com miniaturas de páginas de um catálogo de 1885 da fábrica Ravesteyn, também de Utrecht, onde em uma das pranchas encontrei finalmente o padrão acima, conhecido por "Veelkl".


E não apenas o padrão do friso está no catálogo, mas também o padrão principal da fachada, conhecido como "Bloemruitje" também está lá:


Abaixo vemos exemplares similares aos azulejos de cercadura usados na casa, obtidos no catálogo do Museu do Azulejo da Holanda (Nederlands Tegelmuseum). No catálogo, o nome para este padrão é "Rozelintlijst" (algo como "fita com rosa e listas" ou "fita / lista de rosas").



Abaixo vemos um exemplar similar ao azulejo de padrão principal, que obtive também no catálogo do Museu do Azulejo da Holanda. No catálogo, é indicado que este padrão foi fabricado na Holanda e na Frísia, uma região independente nos Países Baixos.


O azulejo de padrão principal também pode ser encontrado em uma página de um catálogo da Real Fábrica de Azulejos da Holanda (canto inferior direito da página), o que mais uma vez demonstra como nesta época a idéia de direito de imagem e autoria era uma coisa muito difusa, senão inexistente:



Talvez o fato de encontrarmos este padrão em catálogos de mais de uma fábrica explique as variações que podemos perceber entre os exemplares no Museu do Azulejo da Holanda, e os encontrados no Rio de Janeiro, bem como entre aqueles encontrados nas duas casas no Rio de Janeiro. Claro que não estou descartando também as variações que podem ocorrer entre lotes de anos diferentes, bem como lotes executados por diferentes artesãos.

Para terminar, um detalhe de um remendo muito mal feito, mas que de certa forma me lembra muitos remendos que já vi em fachadas em Portugal. A verdade é que à distância, se não se olhar com atenção, é melhor do que um buraco sem os azulejos, e talvez ajude a evitar que a infiltração de água no espaço vazio acabe soltando mais azulejos, que se perderiam. Nesta foto, na parte inferior, fica visível novamente como os azulejos feitos para a restauração são bem pobres quando comparados aos originais.

2 comentários:

  1. Fábio


    O ritmo da tua postagem é como o coração da "Estranha forma de vida" da Amália Rodrigues, coração que corre independente, perdido entre a gente, coração que não comando e que eu tenho dificuldade em acompanhar.

    Enfim, hoje deu-me para o fado, mas já sabes que nós os portugueses adoramos fados e poemadas.

    Tudo isto para te dizer mais uma vez que este teu inventário da azulejaria carioca, se vai avolumando, não só em número, mas também em seriedade.

    Abraços Alfacinhas

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    1. Olá Luis,
      Muito obrigado por suas palavras!
      Eu sou sempre assim; quando investo uma paixão, vira obsessão, e me dedico inteiramente.
      Mas nem tem sido tanto assim. Eu pretendia inicialmente fazer ao menos uma postagem por dia. Mas tenho cuidado para não deixar os azulejos dominarem minha vida, pois tenho outras prioridades, que podem não ser tão apaixonantes de imediato, por não serem mais novidade, como são os azulejos, mas que são o meu eixo mais importante. E as postagens tem se tornado mais complexas, então é melhor fazer menos postagens, mas com mais qualidade, agora que tenho mais informações.
      E ter um público tão de alto nível, como você, Maria Andrade, Manel, Raul Félix, entre outros, é meu grande estímulo para tentar sempre me aprimorar.
      abraços!!

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